18 jan Como lidar com a ISO 26000?
Empresas que participaram da elaboração da ISO 26000 se reuniram em seminário organizado pelo Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV para discutir sobre os desafios que devem ser enfrentados ao incorporar a nova norma de responsabilidade social
Marina Franco – Edição: Mônica Nunes
Empresas que implantam ações de responsabilidade social receberam recentemente uma grande contribuição, a norma ISO 26000, que estabelece diretrizes para negócios focados em temas como direitos humanos, meio ambiente, envolvimento comunitário, entre outros (Leia a reportagem/entrevista ISO 26000 lança sua versão brasileira). Agora, o desafio é saber como essas organizações se adaptarão e incorporarão a nova Norma.
Para estabelecer os desafios, nada melhor do que ouvir das próprias empresas quais são suas expectativas e identificar os desafios têm pela frente. Algumas organizações brasileiras estiveram reunidas no Grupo de Trabalho, coordenado pelo GAO – Grupo de Articulação das ONGs Brasileiras, e participaram da formulação do texto normativo. O objetivo era estudar a Norma e compartilhar conhecimentos sobre o tema. Os resultados desta experiência foram apresentados por Aaron Belinky, secretário-executivo do GAO, durante o seminário Oportunidades e Desafios na Aplicação da ISO26000 nas Organizações, realizado no dia 15 pelo GVCes – Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV.
O maior desafio destacado pelo Grupo de Trabalho foi o de adaptação de ações empresariais à Norma. No caso de empresas que ainda não se relacionam com o tema, o trabalho será maior, já que têm que engajar toda sua estrutura e funcionários. Mesmo nas empresas mais envolvidas, é preciso que a ISO 26000 seja estudada e trabalhada exaustivamente a fim de disseminar esse conhecimento entre todos os profissionais.
“É preciso ler, pensar e debater”, afirmou André Leal, coordenador de Desenvolvimento Sustentável da Braskem. “Surgiram muitas questões no debate entre as empresas do Grupo de Trabalho, inclusive algumas que não estavam tão claras para nós, e elas já estão sendo trabalhadas para aplicar ao nosso trabalho”, disse. Para Juliana Rehfeld, gerente corporativa de Desenvolvimento Sustentável da Anglo American, a grande contribuição da Norma é servir de base para o debate entre os profissionais das empresas. “A maior parte das pessoas é técnica. Responsabilidade social não faz parte da discussão. Por isso, a ISO traz a grande oportunidade de promover uma discussão embasada na sua orientação. O debate não foi esgotado no grupo de trabalho, nem deve se esgotar nas empresas e setores”.
E o trabalho de envolver os profissionais começa com a alta gerência, como afirmou Simone Veltri, gerente de Responsabilidade Social da Souza Cruz. “A governança é fundamental para incluir responsabilidade social na estratégia das empresas. E começa com o engajamento da alta direção. Depois, para o estabelecimento de iniciativas socialmente responsáveis, é diluído pelas demais áreas de negócio”.
Sem dúvida, esta Norma de orientação para a responsabilidade social ajudará a motivar o setor privado a se envolver com o tema. Daí surge mais um desafio identificado pelo grupo: como comunicar de forma correta o alinhamento com os itens da ISO. Já que a Norma não tem caráter de certificação, essa representação não terá tanta visibilidade quanto oferecem os selos. E por abrangerdiversos temas, na prática é impossível que uma companhia siga a todos eles. Por isso deve ser especificado quais itens são seguidos.
Uma das formas de divulgar o seguimento da Norma pelas empresas seria declarar, no balanço de fim de ano, a forma como o instrumento as orienta. “Essa declaração não terá a cara de um relatório de auditoria, mas pode estar presente no relatório de sustentabilidade, dizendo de que forma a organização está adaptada, ou seja, quais os itens da Norma que segue”, afirmou Aaron. Uma das recomendações do Grupo de Trabalho para melhor lidar com a grande abrangência da ISO é que se crie “filhotes” da norma, ou seja, recortes de temas ou itens que a empresa pretende seguir.
O trabalho de comunicação pode dar força à valorização das partes interessadas (ou stakeholders) em ações socialmente responsáveis, como ONGs, sindicatos e grupos empresariais. Um dos aprendizados que surgiu a partir do Grupo de Trabalho foi o de que isto é mais importante do que exaltar tanto suas próprias ações. “A Norma fala que temos que aprender a lidar com a relação tensa que existe entre empresas, ONGs, investidores e sociedade. Se há algum divergência, deve-se privilegiar aquilo que contribua para o desenvolvimento sustentável”, disse Simone Veltri.
Uma vez estabelecidos os rumos para o alcance à responsabilidade social e à Norma, a próxima etapa é calcular seus benefícios econômicos. “O desafio é mensurar os investimentos em responsabilidade social. Estamos testando em algumas empresas, por exemplo, uma ferramenta que calcula a relação entre o investimento em qualidade de vida e de trabalho e o retorno de produtividade”, afirmou Sérgio Monforte , analista de Desenvolvimento Social do SESI – Serviço Social da Indústria. Além deste ramo, as empresas teriam que buscar formas de quantificar o retorno de investimentos em ações em prol de meio ambiente, direitos humanos ou questões do consumidor.
Aaron afirma que, com todo esse trabalho pela frente, a Norma resultará, inevitavelmente, na construção de uma agenda de responsabilidade social positiva para o país. Profissionais, stakeholders e empresas ganharão respaldo para as suas ações e o tema ainda teria maior visibilidade entre a mídia e a população. “Acho que o processo de desenvolvimento desta Norma também vai inspirar muitos processos de outras normas que virão pela frente aqui no Brasil”, acrescentou.
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