14 set Even quantifica e mapeia emissões de carbono em suas obras
Empresa desenvolveu índice de emissões por metro quadrado construído e metodologia para avaliar os resultados
Heloisa Medeiros
A construtora Even começou há dois anos um trabalho de inventário de CO2 para medir seus níveis de emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE). Para isso, dedicou grande esforço a fim de detectar em quais áreas poderia conseguir seu objetivo, criando uma metodologia para estabelecer indicadores confiáveis e medir resultados.
Na verdade, a obra em si é a que menos gera emissões de CO2, pois grande parte delas ocorre fora do canteiro, na fase de industrialização de produtos e insumos empregados na construção dos empreendimentos e na geração de energia elétrica. De acordo com Silvio Gava, diretor técnico e de sustentabilidade da Even, o primeiro passo foi dividir os insumos e materiais em 40 grupos, tais como alvenarias, estrutura, aço, gesso, revestimentos cerâmicos, entre outros. Isso ajudou a elaborar um estudo das emissões e verificar onde seria possível reduzi-las. “Dessa maneira conseguimos segregar as emissões e agora podemos atuar pontualmente na sua diminuição em cada grupo”, declara Gava.
Segundo Débora Rolino Novaes, da ATA (Ativos Técnicos e Ambientais), empresa que prestou consultoria para a Even na área de redução de CO2, a construção civil tem emissões de grande relevância, principalmente se considerada toda a cadeia de valor. “Vários estudos conduzidos pela ATA confirmam que a maior parte das emissões do setor está na fabricação e no transporte dos materiais de construção. Assim, tanto aqui quanto no mundo, cimento e aço são os maiores emissores industriais”, destaca Débora. No Brasil, por exemplo, a siderurgia responde por cerca de 35% das emissões de carbono do setor industrial, enquanto a produção de cimento responde por 19%.
A base de composição do inventário são os cerca de 20 mil itens de 32 orçamentos caracterizados, permitindo criar fatores de emissão para cada grupo orçamentário, que por sua vez são aplicados ao universo de obras entregues em um determinado ano, resultando no inventário total do ano
Para Débora, os inventários na construção civil são bastante complexos, uma vez que as emissões em grande parte são indiretas. “Assim, organizar os inventários de forma completa é uma tarefa desafiadora. Nosso trabalho foi caracterizar e quantificar as emissões de todos os itens que compõem as obras da Even. São milhares de dados compilados, verificados e compostos no cálculo dos fatores resultantes”, analisa. De acordo com Débora, este foi um trabalho inovador, com ajuste de critérios das normas internacionais para as particularidades do setor de construção civil no Brasil.
Ao desenhar a metodologia, a meta da Even, segundo Gava, era incentivar todo o setor. “Concluímos que a forma mais adequada de fazer o inventário seria utilizar como base os empreendimentos entregues no ano e o volume emitido na construção, apropriado por um indicador em metros quadrados construídos e entregues”, descreve Gava. A adoção de um índice de emissões por metro quadrado construído (expresso em tCO2eq/m²) trouxe a vantagem de representar uma unidade de medida que independe do volume de vendas, ou da quantidade de empreendimentos executados no ano. Os inventários e o indicador podem ser visualizados no site da Even.
Norma de base
Com consultoria da ATA, o projeto seguiu as diretrizes da ISO 14.064-1, norma que padroniza os sistemas de quantificação das emissões de gases de efeito estufa. Considerada a norma mais consistente em uso no mercado internacional, permite a construção de inventários de emissão de GEE com transparência. O inventário segue ainda as especificações do GHG Protocol (Corporate Accounting and Reporting Standard), entidade internacional, patrocinada pelo WRI (World Resources Institute) e pelo WBCSD (World Business Council for Sustainable Development).
Segundo Débora, com o desenvolvimento dessa metodologia específica para o setor, a Even compilou as emissões dos empreendimentos do ano de 2010, acrescidas do inventário na área administrativa. De acordo com o indicador, o valor alcançado pela Even foi de 0,275 t de CO2 equivalência por metro quadrado (m²) construído no ano de 2010. Desse total, mais de 99,9% estão relacionados às emissões do Escopo 3, aquelas que ocorrem fora da empresa, ou seja, na fabricação e no transporte dos materiais. “Vale destacar que o valor consolidado tem influência direta das tipologias de sistemas construtivos utilizados pela empresa. Esse também foi segregado na metodologia para que a Even pudesse trabalhar com avaliação de reduções especificamente em cada tipo.”
Conforme informado no relatório de 2009, ficou confirmado que a metodologia de construção adotada anteriormente a 2007, que emitia em média 0,310 tCO2eq/m², foi otimizada pelo novo modelo construtivo acima
Agora, a Even desenvolverá um plano para dar início às primeiras ações para reduzir a emissão de gás carbônico no processo construtivo, ainda este ano. “Vamos mapear onde estão as oportunidades de redução e buscar as medidas mais eficientes juntamente com nossos fornecedores”, afirma. Gava adverte que a mobilização do setor é urgente, pois seus produtos e insumos demandam longos ciclos, da concepção à entrega. “Quaisquer alterações de processos construtivos trarão resultados após dois ou três anos e, portanto, muito próximos das metas referentes às mudanças climáticas estabelecidas para 2020”, diz.
Classificação de emissões
A norma ISO 14.064-1 classifica as fontes de emissão em três escopos. O Escopo 1 – Emissões Diretas são as que ocorrem nos processos e instalações da empresa. O Escopo 2 – Emissões Indiretas da Energia Adquirida, que ocorrem fora da empresa para a geração da energia elétrica ou térmica. E o Escopo 3 – Outras emissões Indiretas, que ocorrem fora da empresa, mas estão relacionadas com sua atividade. Os escopos 1 e 2 são obrigatórios segundo a norma e o 3 é facultativo. Sob a ótica da cadeia produtiva, o Escopo 3 pode incluir emissões upstream (a montante) da operação da empresa, ou downstream (a jusante). O critério de inclusão deve estar relacionado à relevância destas emissões, e ao grau de influência que a empresa tem sobre elas.
No caso da construção civil, o Escopo 3 é muito significativo na questão das emissões, a montante. Trata-se principalmente da produção de cimento, aço e alguns outros materiais, muito intensivos em emissões de GEE. A escolha, a quantidade e a eficiência no emprego destes materiais, em decorrência de critérios de projeto, métodos construtivos e processos de controle e gestão, estão em boa parte no âmbito de influência da construtora. O transporte destes materiais até a obra também pode ser bastante significativo em emissões de GEE. Por esta razão, o inventário de emissões de GEE da Even incluiu as emissões da fabricação e do transporte dos principais materiais empregados nas obras.
Uma das maneiras de fazer as escolhas do Escopo 3, diz Gava, pode estar, por exemplo, na definição do cimento que será utilizado na estrutura. Se forem empregados os cimentos CP III e o CP IV, em cuja composição entrem as escórias de alto-forno e pozolanas (cinzas), respectivamente, a contabilização de emissões será menor. Isso porque ambos aproveitam subprodutos industriais, como pó fino do carvão mineral queimado, argila queimada e pó da casca de arroz, para substituir em parte o clínquer, composto de calcário, argila e minério de ferro ou bauxita, e que exige alta temperatura de forno, com queima de combustíveis fósseis.
“Assim, embora esses cimentos não desenvolvam altas resistências iniciais, necessitando de cura mais lenta e reescoramentos por um tempo maior, pesarão menos na contabilidade final do inventário”, analisa Gava. Ele ressalta que, na fase de produção da estrutura, a velocidade da obra será menor, ou seja, isso tem de ser levado em conta no planejamento do empreendimento. Por outro lado, além de menores emissões, estes dois tipos de cimento são mais resistentes a ambientes agressivos, por serem menos porosos. E consequentemente tornam as obras mais duráveis, aumentando a qualidade das estruturas e evitando patologias.
Gava relata que todas as obras da Even entregues em 2011 já contam com seus respectivos inventários de carbono. “O inventário é importante, pois se a empresa não sabe quanto emite, também não sabe como reduzir. Nossa meta é reduzir emissões acima de 10%. Acredito que vamos conseguir, pois já estamos trabalhando com sustentabilidade na empresa há seis anos e também não sabe como reduzir nosso projeto é bastante consistente”, pondera.
A contabilização
Um orçamento típico da Even é composto por cerca de 2.500 itens. Como a execução da obra tende a ser fiel ao orçamento, a empresa decidiu considerá-lo como base do inventário. Assim, uma análise detalhada dos resultados permitiu destacar a real composição das emissões de GEE das obras, e a relevância das diferentes fontes, entre outros parâmetros. Possibilitou também verificar diversas características do sistema orçamentário e de controle de obras, de forma a compatibilizar o inventário com os demais sistemas gerenciais existentes na empresa.
Para o inventário do ano base de 2010, foram adotados fatores de emissão de Grupos por metro quadrado de área de prefeitura construída. Considerando que a Even trabalha com alto grau de padronização em suas obras e tem uma estrutura orçamentária aprimorada, o inventário se baseou nas áreas construídas efetivamente entregues no ano, classificados em quatro tipos: estrutura convencional, alvenaria estrutural, pré-moldados e obras comerciais
O inventário definiu fatores de emissão para cada um dos cerca de 40 grupos orçamentários utilizados pela Even, em todas as obras, e para cada tipo de obra. Cada grupo orçamentário corresponde a um agrupamento de materiais e atividades. Como as obras foram classificadas em quatro tipos, chegou-se ao número de 160 fatores de emissão.
Para a construção dos fatores de emissão foi definido um grupo de 32 obras em andamento em 2010. O trabalho estendeu-se por vários meses, em que foram considerados cada um dos materiais aplicados, verificando-se suas características de catálogo ou especificações dos fornecedores, dimensões e respectivos fatores de conversão dimensional, além dos materiais a partir dos quais são fabricados. Esta pesquisa levou à formação de um extenso banco de dados de raiz. Estes dados individuais foram então agrupados conforme a estrutura orçamentária de cada uma das 32 obras, após uma avaliação estatística para verificar a uniformidade dos grupos.
A base de composição do inventário se baseou em cerca de 20 mil itens dos 32 orçamentos caracterizados, permitindo criar fatores de emissão para cada grupo orçamentário, que por sua vez são aplicados ao universo de obras entregues em um determinado ano, resultando no inventário total do ano.
Emissões dos empreendimentos da Even em 2010
Isso possibilitou a criação de fatores de emissão confiáveis para os grupos orçamentários. Três elementos compuseram a realização do trabalho: definição de itens relevantes para emissões de GEE, caracterização dos itens para elaboração de fatores de conversão e determinação de fatores de emissão dos materiais que compõem cada item. Esses elementos permitiram calcular as emissões relativas a cada item de cada grupo de cada obra, possibilitando criar um fator de emissão para cada Grupo por tipo de obra.
Para gerar fatores mais representativos, as obras foram separadas por tipo de método construtivo utilizado. Desta forma foi possível estabelecer a média de emissões por metro quadrado de área de prefeitura para cada Grupo. Também foi feita uma análise de desvio padrão dos índices para cada Grupo, permitindo determinar a confiabilidade ou adequação de utilização de fatores gerais, para cada situação específica.
Finalmente, das 16 obras que foram entregues em 2010, 15 foram inventariadas. Desta forma, os índices utilizados este ano têm forte relevância considerando os métodos e materiais utilizados nas obras. O ano base de um Inventário de GEE é o ano de referência para futuras comparações. Trata-se de identificar um ponto de referência em cima do qual avaliar as ações a serem adotadas.
Fonte: PiniWEB